#120: Incoterms

Num mundo onde um tênis vendido em uma loja do interior de São Paulo pode ter sido produzido no Vietnã, com sola da China e embalagem do México, entender quem é responsável por cada parte do trajeto da mercadoria não é só uma questão de organização, mas uma necessidade para que o comércio funcione com alguma previsibilidade. É nesse cenário que surgem os Incoterms, sigla para International Commercial Terms, ou “termos internacionais de comércio”, em tradução livre.

📍Definição

Incoterms são, basicamente, um acordo entre vendedor e comprador sobre quem assume os custos, riscos e responsabilidades em cada etapa do transporte de uma mercadoria internacionalmente.

Imagine que você comprou um produto online vindo do exterior. Na hora do checkout, você vê dois tipos de frete: um mais barato, mas sem rastreio e com impostos por sua conta, e outro mais caro, com tudo incluso, entregue na porta da sua casa. Essa escolha é, em essência, um reflexo dos Incoterms. Eles definem até onde o vendedor leva a carga, quem paga pelo transporte e pelo seguro e quem lida com desembaraço aduaneiro e impostos.

Na prática logística, essas regrinhas evitam confusões do tipo: “Quem deve pagar a armazenagem no porto?” “De quem é a responsabilidade se a carga for extraviada no mar?” “O imposto de importação já está incluso?” Sem Incoterms, cada exportação seria uma nova negociação do zero.

🧭 Uma história de quase 100 anos

Os Incoterms foram criados pela Câmara de Comércio Internacional (ICC) em 1936. Antes disso, os acordos comerciais internacionais eram, no mínimo, um campo minado de mal-entendidos. O vendedor achava que a responsabilidade terminava ao colocar a carga no navio, enquanto o comprador achava que o frete estava incluso até sua porta. O resultado? Litígios, atrasos e prejuízo.

Desde então, os Incoterms passaram por diversas atualizações. As mais recentes ocorreram em 2010 e 2020, adaptando os termos à realidade dos negócios digitais, do transporte multimodal e das novas exigências de segurança. Entre os marcos históricos, temos:

  • Em 1953, com o crescimento do comércio pós-Segunda Guerra, os Incoterms começaram a ser adotados em escala global.
  • Em 1990, a versão dos termos incluiu o transporte aéreo de forma mais específica.
  • Em 2010, com o aumento das transações online, os Incoterms passaram a incluir modalidades mais flexíveis.

Segundo a própria ICC, mais de 90% dos contratos internacionais de compra e venda utilizam Incoterms de forma explícita ou implícita.

💰 Quem paga o frete?

Entre os Incoterms mais conhecidos, dois extremos ajudam a visualizar bem a diferença entre as responsabilidades:

  • EXW (Ex Works): o vendedor disponibiliza a mercadoria em seu galpão. O comprador cuida de tudo a partir dali (transporte interno, exportação, frete internacional, importação e entrega final). É como pedir um bolo e ter que buscar na casa do confeiteiro, embalar e levar pra festa, ou seja, tudo que acontecer no trajeto a partir da saída do galpão é de responsabilidade do comprador.
  • DDP (Delivered Duty Paid): aqui é o oposto. O vendedor entrega o produto no endereço do comprador com todos os impostos pagos. É o “frete grátis com tudo incluso” das compras internacionais.

Entre esses dois, há outros termos importantes como:

  • FOB (Free On Board): vendedor entrega a mercadoria no porto de origem, já embarcada no navio.
  • CIF (Cost, Insurance and Freight): vendedor cuida do transporte e do seguro até o porto de destino.
  • DAP (Delivered at Place): vendedor leva a carga até o país do comprador, mas os impostos ficam por conta de quem recebe.

Se quiser mais detalhes sobre todos os incoterms disponíveis, clique aqui.

😖 Por que isso ainda gera confusão?

Apesar de existirem há décadas, muitos profissionais ainda usam os Incoterms de forma incorreta. Um erro comum é usar FOB em transporte rodoviário, sendo que esse termo é exclusivo para transporte marítimo. Para cargas que envolvem mais de um modal (avião, caminhão, navio), o ideal seria usar termos mais apropriados para transporte multimodal, como FCA (Free Carrier), onde o vendedor entrega a carga ao transportador indicado pelo comprador, em um local combinado (pode ser no pátio da fábrica, num terminal rodoviário, ou centro de distribuição, por exemplo) ou CPT (Carriage Paid To), onde o vendedor paga o frete até o destino, mas o risco é do comprador a partir da entrega ao transportador.

Outro equívoco frequente é assumir que o uso de um Incoterm significa que o frete está pago, quando na verdade ele define quem deve pagar, não se já está pago. Em um estudo feito pela Freightos, plataforma de logística global, mais de 40% dos compradores iniciantes usaram o Incoterm errado ao negociar com fornecedores asiáticos, o que resultou em custos adicionais inesperados.

🤔 E se eu não usar Incoterm nenhum?

A ausência de Incoterms em contratos internacionais é como jogar futebol sem regras. Na primeira falta, começa a confusão. O vendedor diz que não era com ele, o comprador acha que o seguro cobriria… e, no final, ambos saem no prejuízo. Além disso, algumas legislações nacionais exigem que os Incoterms estejam descritos na documentação para fins fiscais, especialmente em países com regimes de comércio exterior mais rigorosos.

🧠 Onde aprender mais sobre o tema?

Se quiser ir além, a ICC disponibiliza cursos oficiais e atualizações sobre os Incoterms no site deles. A World Trade Organization (WTO) disponibiliza em seu site diversos vídeos que explicam sobre diferentes situações. Outras plataformas, como Coursera e edX, oferecem cursos gratuitos com foco prático.

Mesmo que sua empresa não faça comércio internacional, entender Incoterms ajuda a negociar melhor com fornecedores globais, evita surpresas no custo de entrega e ainda mostra profissionalismo em negociações. Num mundo cada vez mais conectado, onde um clique separa a compra do produto e sua chegada, saber quem faz o quê na cadeia logística é parte da estratégia de mercado.

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